quinta-feira, 4 de junho de 2020

A ineficiência da guerra às drogas e o encarceramento sistêmico de negros.

ATENÇÃO! O seguinte artigo foi escrito com base nos estudos de Juliana Borges e sua entrevista concedida à Djamila Ribeiro no Canal Feminismos Plurais. O tema está mais aprofundado no livro Encarceramento em Massa, da própria Juliana. Todas as fontes estão listadas no final do artigo.


Que a guerra às drogas é ineficiênte, isso é incontestável. Os números apontam para uma ineficiência governamental sobre o problema e a abordagem mais do que ultrapassada que se dá ao problema social. Aliado a isso, temos a deficiência do sistema judicial em sentenciar de maneira justa os indivíduos presos por posse de drogas. E para completar o combo da abordagem falha, temos o sistema prisional extremanente punitivo e falho quando se propõe a readequar seus prisioneiros à sociedade... Será mesmo que se propõe?

Para iniciar nossa contemplação dessa realidade, vamos trazer os pontos levantados por Juliana Borges durante entrevista concedida no Canal Feminismos Plurais. Djamila pincela o caráter punitivo do sistema correcional, lembrando da máxima conservadora tão defendida nos meios reacionários do país: "Bandido bom é bandido morto". Essa brilhante lembrança nos lembra que moramos num país extremamente racista, quando percebemos que há bandidos de pele clara, colarinho branco e que estão inseridos num contexto socio-econômico que os priva de qualquer tipo de punição. O Brasil pune sistematicamente quem é pobre e negro. Se for mulher negra, os números são mais expressivos, como veremos a seguir.

Juliana começa explicando o termo "encarceramento em massa". Para longe da noção de grandes ônibus lotados de detentos entrando a cada hora nas prisões, o termo é bem mais abrangente e bem mais compreendido com a apresentação de alguns dados. Juliana apresenta o seguinte cenário:

O Brasil é o terceiro país que mais encarcera no mundo.

O Brasil está entre os 30 países com maior taxa de encarceramento do mundo. 

O Brasil está em 3º lugar na quantidade de pessoas presas. Atrás somente dos EUA e da China. Atualmente, segundo dados do DEPEN divulgados em 14 de Fevereiro de 2020, até junho de 2019, a população carcerária do brasileira era de 773.151 presos, número que triplicou desde 2000. A taxa de encarceramento a cada 100 mil habitantes passou de 137 para 367,91 até junho de 2019. Não dá para ignorar o contigente carcerário gigantesco que temos em nossas mãos.

Motivações para as prisões

Assim como existem diversos tipos de prisões, há também diferentes tipos de formas de punição e restruturação social de um criminoso., que podem ser aplicadas como alternativa de encarceramento. Esses tipos de condenações são conhecidas como penas alternativas. De acordo com o artigo 44 do Código Penal, as penas restritivas de direitos podem substituir a prisão clássica se a pena for menor do que quatro anos de prisão. Além disso, o crime pelo qual o réu foi condenado não pode ser violento ou de grave ameaça. Também cabem penas alternativas nos casos de crime culposo. Lembrando que a pena para adquirir, guardar ou trazer consigo substância entorpecente ou que determine dependencia química ou psíquica é de seis meses a dois anos. Ou seja, há sim a possibilidade de enxugar o número de pessoas que são encarceradas, apenas aplicando medidas alternativas. 

Aliado a isso, a quantidade de presos provisórios em 2018 era de cerca de 40%. Adicione à conta o fato de que o sistema prisional está lotado em mais de 30%. Juliana conclui a partir desses dados que se o governo resolver os crimes com presos provisórios, já poderia diminuir o número de encarcerados e terminar com a superlotação dos presídios. 

Perfil dos presos:

A maioria dos presos subdivide-se em mais de 20% para roubo. Porém, entre 2005 e 2013 o aumento no número de presos para tráfico cresceu em 339%. Esse número é consequencia direta de uma alteração na Lei de Drogas, que trouxe penas mais duras para os traficantes, porém teve um efeito perverso para os usuários e pequenos traficantes.

Apenas 11% dos presos estão encarcerados por homicídio. 

No caso das mulheres, o tráfico é responsável por mais de 50% que estão presas. 

Apenas pela análise desses dados, podemos concordar com Juliana quando a mesma diz que a guerra às drogas é um instrumento de encarceramento em massa. A mesma afirma na entrevista para o Canal Feminismos Plurais: "A guerra às drogas é um dos principais mecanismos para termos esse cenário de grande encarceramento no Brasil".

Boom no número de encarcerados

De 2004 a 2016, houve um aumento de mais de 500% no número de mulheres encarceradas, de acordo com Juliana. Desse contigente, mais de 60% são de mulheres negras. Tal cenário contribui para o estereótipo de que preto e bandido são sinônimos.

Muitas vezes, as pessoas presas vão para o cárcere por uma quantidade apreendida muito baixa. Como um exemplo, Juliana apresenta um estudo que, em 2018 constatou que no RS, mais de 70% das apreensões de pessoas portando drogas, não chegavam nem a 42 gramas. O dado torna-se muito mais patético quando levamos em consideração que em Portugal, quantidades até 42 gramas, categorizam o portador como usuário e, portanto, não configuram prisão.

 Não podemos negar que há um grande número de pessoas negras nas prisões do Brasil, porém podemos indagar se são legítimos os processos judiciais que os colocam ali. Quando percebemos que é sistemático o ato de levar negros e pobres para a prisão, podemos começar a perceber como os estereótipos são formados e como os mesmos estigmatizam a comunidade negra. 

Conclusão

É urgente a necessidade de se repensar o sistema prisional, o encarceramento sistemático e punitivista e a reforma do nosso sistema correcional. 

A guerra às drogas é ineficiente e só serve para inflar nossas prisões e muitas vezes pune de forma severa quem está apenas usando a droga e não traficando de fato. E quando se pune traficantes, aquele traficante de universidades, baladas, festinhas e reuniões, que é branco e estudante, fica de fora da punição do Estado, que possui um sistema punitivo arquitetado para prender somente jovens negros e pobres. 

O encarceramento em massa é real e deve ser combatido. Uma das melhores maneiras de livrar nosso país desse peso em nossas prisões é levar em consideração o respeito à liberdade do cidadão de legalmente consumir a substância que melhor lhe aprouver. A liberdade civil pressupõe que o Estado não é patrono da vida do cidadão. O indivíduo é dono de sua vida, seu corpo e suas ações. Se o uso recreativo de tais substâncias dizem respeito à somente o indivíduo, o Estado precisa rever a necessidade de abandonar a guerra às drogas, pois a mesma já se provou ineficaz há muito tempo. Além de ineficaz, virou instumento de encarceramento da população negra.

Fontes:

https://www.gazetadopovo.com.br/republica/populacao-carceraria-triplica-brasil-2019/#:~:text=At%C3%A9%20junho%20de%202019%2C%20a,at%C3%A9%20junho%20do%20ano%20passado.

https://www.politize.com.br/penas-alternativas-a-prisao-no-brasil/

https://g1.globo.com/politica/noticia/um-em-cada-tres-presos-do-pais-responde-por-trafico-de-drogas.ghtml

https://www.youtube.com/watch?v=cIBRsLA8ECQ&t=2251s

terça-feira, 13 de novembro de 2018

Somos Todos Lendas - Uma experiência Queen para a nova geração

Por Dimi Queiroz

"Somos todos lendas". A frase é uma das falas de Freddie Mercury no mais novo longa biográfico Bohemian Rhapsody, que conta um lado olimipiano, quase que livre de falhas, do maior frontman do rock. O filme serve como uma experiência quase documental - não fiel à cronologia - da maestria singular com a qual Mercury compôs suas músicas, performou e viveu.

Somos apresentados a um Mercury já dado à vida noturna, rebelde e quase que tímido no meio de uma multidão. Logo nos primeiros minutos apresenta-se para ser o vocalista do trio Smile, onde apenas Roger Taylor e Brian May apareciam. Em poucos minutos, como que magicamente, John Deacon se une a banda e os mesmos já estão indo gravar seu primeiro disco. O filme não se preocupa em mostrar os reveses de uma banda iniciante, com suas dificuldades em encontrar shows, contratos e seu lugar ao sol. Talvez por isso tenha ficado insoso para alguns fãs, que esperavam uma biografia da banda em si e não uma ode à Mercury. Ficamos sem saber dos dramas pessoais dos outros membros da banda, seus sonhos, esperanças e medos, tudo em prol de Mercury, que sempre é a pedra fundamental onde o roteiro se prende.

As cenas com Mercury servem para mostrar a destreza de Rami Malek, o qual nos entrega um Freddie altivo, performático e escandaloso no palco e no dia a dia. Não dá pra analisar sua interpretação como caricata, pois o próprio Mercury, em vida, dentro e fora dos palcos demonstrava uma persona quase que inventada, mas mesmo assim muito pessoal. Por outro lado, vemos uma direção preocupada em endeusar e maquiar o personagem de Malek, pondo-o como um menino inocente que foi posto em situações por conta de companhias más e não por sua personalidade rebelde e forte. Ponto negativo, principalmente na cena onde Mercury termina seu relacionamento profissional com Paul Prenter, com uma dramaticidade que beirava o dramalhão mexicano com pitadas de comédias românticas dos anos 90.

Sente-se a falta de um retrato mais visceral do que seria a vida de uma banda de rock nos anos 70. Faltou exploração dos dramas pessoais dos outros membros da banda. E, quando os dramas de Mercury eram explorados, faltou profundidade. Apenas menções a drogas, sexo e bebedeiras. Mas não nos são apresentados as falhas de caráter, erros e defeitos daquele que deveria ser um humano carnal, mas beira o angelicalismo espiritual.

Mas o filme tem seus momentos de ápice e glória, como a recriação da apresentação mais icônica da banda Queen: Live Aid. Recriado quase como que fielmente e com pontos positivos para figurino, maquiagem, montagem design de produção e fotografia. Os momentos finais do filme merecem m lugar cativo no hall dos melhores momentos em filmes. Digo sem medo. Mas, os méritos maiores do filme, não são necessariamente do filme em si, pois sem as músicas já anteriormente criadas e imortalizadas pela bada Queen, o filme não se suportaria.

Por fim, Bohemian pode ser classificado como uma experiência em tela grande para fãs e a nova geração que ainda não conhece Queen. Impossível sair da sala de cinema sem um gostinho mais apurado pela banda e por seu frontman Freddie Mercury.


sexta-feira, 13 de julho de 2018

TRÊS FILMES PARA ASSISTIR NO DIA DO ROCK N ROLL

Por Dimi Queiroz

O dia mundial do Rock n´ Roll é comemorado todo dia 13 de Julho. Nesse ano de 2018 o dia cai numa sexta-feira, 13. Uma data que ficou famosa primeiro no mundo do entretenimento cinematográfico com o filme homônimo que homenageia a data e que traz de volta o assassino Jason. Uma coisa, inicialmente não tinha nada a ver com a outra. Porém como o Rock sempre foi acompanhado de superstições e misticismo em torno de si pelos mais conservadores, ao longo do tempo foi sendo uma conexão que, quando acontece (como no caso de hoje), é motivo para deixar os ânimos mais exaltados. Tanto de um lado quanto de outro.

Como começou?
Apesar de ser considerado "dia mundial do Rock", a data só é comemorada no Brasil. Acredite se quiser! O dia 13 de Julho foi escolhido para celebrar o gênero musical em homenagem ao Live Aid, mega evento que aconteceu no mesmo dia, em 1985. Aparentemente, um dos participantes do evento, um tal de Phil Collins, expressou o desejo de que aquele dia fosse mundialmente reservado para celebrar o Rock and Roll.

Em meados dos anos 90, duas rádios paulistanas dedicadas ao Rock começaram a mencionar a data em sua programação. Obviamente a data foi amplamente aceita pelos ouvintes e aos poucos ganhando peso e prospecção nacional. Hoje, por todo o Brasil a data é lembrada com muito amor pelos fãs do gênero. Ao passo que ao redor do mundo, a data não é nem um pouco conhecida.

Como celebrar?
Não é uma data como o Halloween ou Natal, que conta com um costume próprio como o de se fantasiar ou juntar-se com a família e amigos ao redor de uma mesa para comer muito! Cada adepto do Rock pode celebrar a sua própria maneira. Como esse blog é feito por uma pessoa fã de cinema mais do que qualquer coisa, eu proponho aqui três filmes que podem fazer o caro leitor reviver tempos gloriosos na vida de artistas que influenciaram diretamente esse estilo, praticamente em suas raízes. Cada um a sua maneira, claro. Mas igualmente importantes.

Os Reis do Iê Iê Iê (A Hard Days Night, 1964)
Obviamente a minha lista vai começar com os Beatles. Não poderia e nem deveria ser diferente. O primeiro filme estrelando o quarteto de Liverpool vêm celebrar sua carreira e foi lançado juntamente com o álbum A Hard Days Night. O grupo usou o cinema como maneira de divulgar suas músicas e deu muito certo! O filme foi indicado a dois Oscars. Para além de qualquer membro da banda, o filme celebra os Beatles como um todo e mostra a beatlemania, fenômeno que tomou conta da juventude da época a nível mundial, quando praticamente todos os jovens, principalmente meninas adolescentes, idolatravam os músicos. Naquela época, se você fosse uma garota, com certeza tinha o seu Beatle preferido. Se fosse rapaz, com certeza queria ser um deles. Eram implacáveis e o filme mostra como isso se refletia trazendo imagens reais de perseguições de fãs, show e muito bom humor de John, Paul, Ringo e George.

Não Estou Lá (I´m Not There, 2007)
Inspirado na vida do cantor e compositor Bob Dylan, o filme se destaca por conta da quantidade de atores que interpretam Dylan em momentos diferentes de sua carreira: apenas seis intérpretes, incluindo uma mulher (Cate Blanchet), nos fazem passear por várias facetas do cantor ao longo de sua prestigiada carreira. O longa é uma amostra da capacidade de atuação de Cate Blanchet, que foi indicada a um Oscar e venceu um Globo de Ouro pelo filme. Porém os outros atores não ficam desfocados em seus papéis. Vale muito a pena prestigiar o longa que homenageia um dos mais controversos e versáteis artistas do cenário musical. Até hoje as influências de Dylan são sentidas no Rock. O próprio cantor chegou a comentar sobre o filme em 2012 em uma entrevista para a revista Rolling Stone. Ao ser perguntado se tinha gostado do filme, Dylan disse: "Achei que ficou bom. Você acha que o diretor se preocupou com que as pessoas o entendessem? Não acho que ele se importou nem um pouco. Acho que ele só queria fazer um filme. Eu achei que ficou bom e aqueles atores foram incríveis". Com esse elogio vindo diretamente da fonte de inspiração para o filme, não deveria haver dúvidas sobre a qualidade. Fica a dica para acompanhar com uma boa pipoca.

Janis Joplin: Little Girl Blue, 2015
Imagine uma garota nascida em uma pequena cidade do Texas em 1943. Se eu dissesse que essa garotinha gostaria de ser cantora, obviamente qualquer um pensaria em dizer-lhe para seguir carreira no Country ou no máximo no folk. Mas Janis nunca foi convencional, tradicional e muito menos coerente. Janis Joplin: Little Girl Blue conta a história da mulher que abriu as portas para outras mulheres brilharem no Rock and Roll. Se você gosta de histórias de pioneiros, essa é para você. Janis quebrou barreiras em uma America ultraconservadora. Com uma voz forte e rouca, com muito Soul e atitude, Janis abriu o caminho que outras mulheres viriam pavimentar. Se hoje enlouquecemos ao som de vozes femininas no Rock, devemos e muito a Janis. O documentário revela sua história e como ela conseguiu tornar-se um ícone, mesmo com poucos anos de carreira. Morreu aos 27 anos de idade, cedo e de repente. Porém deixou um legado digno de honra.

Essa foi a lista de hoje para curtir muito o Rock, aprendendo um pouco mais sobre apenas alguns dos artistas que o impulsionaram para ganhar o mundo todo. Vale lembrar que Quase Famosos e Escola de Rock podem até ser filmes muito bons, mas na hora de celebrar o Rock, eu prefiro ficar com a realidade da vida de pessoas que viveram/vivem e que até hoje ainda ensinam ao mundo como fazer o bom e velho Rock and Roll.

domingo, 2 de julho de 2017

Quando o oprimido se torna o opressor

O que é mais triste no meu dia a dia, é quando eu vejo preconceito sendo institucionalizado dentro da comunidade LGBT. Isso só prova o quanto nós ainda temos que aprender mais sobre a pluralidade LGBT. Informação é o antídoto para o preconceito. Então que eu possa fazer esse blog cumprir seu papel de desconstruidor de conceitos e permitam-me compartilhar o pouco que penso sobre tudo isso.

Na sociedade em que vivemos (patriarcal), os papeis de gênero são muito bem delimitados e condizentes com a cultura machista perpetuada por séculos até hoje. Homens e mulheres recebem, desde o nascimento, obrigações, deveres, direitos e favores devido ao gênero ao qual pertencem. Gênero esse que é delimitado por apenas um fator biológico: o órgão genital com o qual nasceram. Mas essa delimitação de tarefas e papéis baseados em gênero, trouxe também opressão e discriminação baseadas. Há muito pano pra manga na discussão de gênero e é importante que essa discussão seja levada para a escola e também os lares. Porém, ainda não estamos vivendo esse momento no Brasil. Então tentamos usar a internet como espaço democrático que é para discussões e trazer mais consciência para as pessoas.


Afeminofobia presente nos aplicativos gays: "Gosto dos meus homens como
meus dentes: alinhados (não afeminados) e brancos. (...)
O que trago hoje é um pensamento balizado pela aversão ao feminino. Afeminofobia é um termo utilizado para referir-se à aversão a gays afeminados. Aqueles homens homossexuais que não agem de acordo com papéis de gênero estabelecidos pela sociedade heteronormativa. Isso se reflete em estatísticas bem expressivas. O site Gay Times publicou um estudo que revela que mais da metade dos gays não afeminados (57%) acham que seus colegas afeminados dão uma reputação ruim ao coletivo homossexual masculino. O relatório, assinado por Cal Strode, entrevistou 280 gays do Reino Unido e Califórnia e comparou as opiniões dos que se autodenominavam straight-acting (não afeminados) com o resto. Os dados mostraram conclusões importantes entre o coletivo straight: esses sofreram 33% a menos de episódios de homofobia na escola do que seus companheiros afeminados e 35% deles concordavam com essa afirmação: “Eu me identifico mais com a comunidade heterossexual do que com a gay”. 


Afeminofobia nas redes sociais


A heteronormatividade é responsável pela perpetuação da ideia de que o aceitável para um homem é que ele adote comportamentos e pensamentos condizentes com seu órgão sexual. Assim, a afeminofobia se faz presente quando há o desprezo por aqueles que não cumprem seus papéis de gênero (pré) determinados por uma sociedade machista. Hoje vivemos num mundo que olha o feminino com olhar chauvinista e misógino. O feminino é visto como algo inferior quando comparado ao masculino. Então essa afeminofobia está mais em destaque hoje por ser bem mais visível. Mas é tão antiga quanto o machismo.

Com a acensão de aplicativos de relacionamentos gays, como o Grindr e até mesmo o próprio Tinder (que não é necessariamente gay porém serve ao mesmo propósito), o usuário tem a liberdade de colocar em seu perfil o que procura num parceiro. É muito comum ver usuários de Grindr, por exemplo, exigindo que seus supostos futuros parceiros não sejam afeminados. Além disso, o problema reside no fato de que muitos desses homens não afeminados fazem questão de usar palavras do vocabulário hétero, como se fosse um tipo de máscara linguística que usam para tentar passar a impressão de que não são homossexuais. Tudo uma tentativa frustrada de encaixar-se em padrões reforçados pelo machismo e que prejudicam e não ajudam em nada a comunidade LGBT e demais pessoas da sociedade, sejam elas hétero ou homossexuais.


Um problema de todos

A afeminofobia não afeta somente os LGBT. Mas é algo que afeta a todas as pessoas. Diz respeito tanto à lésbica masculinizada quanto ao transsexual. A heteronormatividade impõe regras de comportamento tanto a LGBTs quanto a heterossexuais, sejam eles homens ou mulheres. Homens que usam cabelo comprido e brincos podem ser tão discriminados quanto mulheres que usam uma gravata ou suspensório. O relatório Abrazar a diversidade, elaborado pelo Instituto da Mulher em 2015, mostra que 20% dos estudantes espanhóis foram testemunhas de agressões homofóbicas e transfóbicas nos colégios. Uma violência que não ocorre somente contra meninos e meninas que manifestaram sua orientação sexual, mas contra aqueles que unicamente apresentam comportamentos próprios do outro sexo. O problema não é culpa unicamente de homens gays que perpetuam esse preconceito. A mídia tem uma parcela grande da culpa ao representar em seu conteúdo de entretenimento, personagens gays afeminados caricaturados, que servem única e exclusivamente para proporcionar humor, geralmente pautado por estereótipos preconceituosos e totalmente distorcidos de realidade. 

A misoginia também é culpada por perpetuar o feminino como algo que deve ser usado como objeto. Gays femininos são colocados no mesmo espectro que travestis, transgêneros e drag queens como performances objetificadas e usadas somente para o prazer de um pagante. Sendo assim, prejudica a maneira como os afeminados são vistos e respeitados na sociedade. Quando o oprimido se torna o opressor e há uma troca nos pólos do processo intimidador/intimidado, a luta se torna mais difícil e árdua, pois inclui metas de desconstruir também vários LGBTs.



sexta-feira, 16 de junho de 2017

Nunca doar 100%

O título dessa publicação foi dado por uma amiga tão sábia que poderia ser membro do conselho Jedi. Real oficial!

Ela é sagitariana e sabe tudo sobre não se prender a ninguém. Se o mundo fosse uma gaiola, ela já o teria destruído e ido passear pelo universo. Às vezes imagino que se ela pudesse, o faria.
Eu sou uma canceriana que gosta de estar junto, abraçar, conchinha. Ela prefere cada um jogado no seu canto na cama.
Eu gosto da ideia de casamento, ela gosta da ideia de "não sou de nignuém, eu sou de todo mundo e todo mundo me quer bem".
Eu gosto de Backstreet Boys, Paulo Ricardo e Beatles.
Ela gosta de sertanejo sofrência.
Ela sofre sendo feliz.
Eu sou feliz sofrendo...
Mas de alguma forma inesperada, num desses videokes da cidade, o universo nos juntou e temos uma bela amizade desde então. Deus me trouxe nela um poço de sabedoria e conselhos que, quando eu tiver a coragem de seguir, serei mais feliz. O problema é que eu quero prender e ela pede para eu soltar.

A pessoa que vos escreve acredita no amor, cresceu com os desenhos que falam em "final feliz" e sonha um dia encontrar alguém para si. O maior ensinamento de todos esses gurus do amor é que todos nós temos que deixar que o universo traga, sem forçar nada. Quando chega, não podemos nos prender. Que coisa mais difícil e confusa para uma canceriana! Preciso soltar, relaxar, deixar ir pra que possa chegar. Quando chega, eu não posso prender. Tenho que deixar ali no canto dele, acreditando que é meu e que se for realmente pra ser... será.

Minha amiga sagitariana tiraria isso de letra. Afinal, é o signo mais independente do zodíaco. Mas eu, pobre canceriana desprovida de prática para o desprender, acho isso a coisa mais horrível do mundo.

Aparentemente, quando eu me desprendo e não ligo, não mando mensagem, não pergunto se dormiu bem, me sinto uma pessoa fria e totalmente diferente. Me sinto uma pessoa horrível. Sinto que devo mostrar os sentimentos porque a vida é tão pequena, curta e deve ser vivida em seu mais intenso significado. Eu grito, esperneio e falo mesmo que gosto. Mas fazendo isso, afasto, expulso, assusto.
Nada é perfeito, não é verdade?

O grande conselho da sagitariana, nunca doar 100%, desaparece do meu HD emocional quando fico com alguém. E por mais que eu tenha tomado a decisão, bem antes, de não me apaixonar... Eu me apego. Todos os conselhos são em vão e eu faço aquele famoso papel de trouxa novamente. Parece até um círculo vicioso.

Mas a grande questão é essa: Devo deixar de amar por causa disso? Deixar de ser quem eu sou em essência só pra me moldar do jeito doentio como as pessoas se tratam hoje em dia? Será que eu devo agir como todo mundo e transformar o meu coração num canto tão frio a ponto de Elza se sentir em casa?

Não penso que deve ser assim. Vou continuar sendo como eu sou. Vou continuar amando sim e se for pra sofrer que pelo menos seja por algo que me completou em um momento. Acredito que o significado de amar-se seja isso... Doar quem você é não porque não quer se preservar, mas porque sabe a pessoa maravilhosa que é e adoraria compartilhar isso com alguém. Se a pessoa não quer ou não está em condições de te ter, bola pra frente. Porque assim como até então você vivia bem sem aquela pessoa na sua vida, você viverá bem sem ela daquele ponto em diante.

Que possamos demonstrar sempre o que sentimos e pensamos.
As pessoas precisam disso.
O mundo precisa disso.
Acredito que principalmente os que não acreditam mais no amor precisam disso.

sexta-feira, 28 de abril de 2017

Machismo (lésbico) de cada dia...

Um dia, em algum tweet da vida, eu li a seguinte afirmação: "Ninguém nasce desconstruído, só Lego".

Achei lindo, achei o máximo e adotei pra mim. Até porque eu estou em processo de desconstrução profunda desde que me assumi como mulher lésbica. Ainda estou processando muitas informações e conceitos, mas vamos lá... Crescendo sempre. No momento em que comecei essa nova postagem, estava ouvindo Bon Jovi, mas depois coloquei Karol Conka e MC Carol, pra dar aquela inspirada. Sabe coisa de quem vai pra academia ouvindo Sia com David Guetta? Pois é... Música ajuda muito no momento.

Eu cresci com exemplo de mulheres guerreiras perto de mim. Mulheres que fizeram a diferença. Mulheres que pegam no batente. Mulheres de atitude. Minha mãe a maior delas. Todos esses exemplos me ajudaram a construir desde pequena a noção (obrigada mãe por esse grande conselho), de que eu deveria estudar para "não depender de homem algum" quando ficasse adulta. Quando criança eu não entendia o verdadeiro motivo de tal conselho. Hoje com quase 30 anos de existência (quase nenhum de experiência), eu posso dizer que sim, infelizmente eu entendo direitinho o porquê desse conselho. E procuro aqui explicar esse porque.

Começando pelo óbvio. Vivemos SIM numa sociedade machista. Isso não é novo. Porém, está tão enraizado em nossa sociedade (e, porque não, em nós?), que até mesmo em relações lésbicas (ISSO MESMO), vemos esse machismo sendo reproduzido. Relações onde deveriam have duas MULHERES exercendo seus papéis conforme os ditames de sua própria identidade de gênero, vemos várias delas reforçando em seus papéis ou de suas companheiras, esse machismo nosso de cada dia. Um machismo que contamina até mesmo membros da comunidade LGBT, que é a que mais sofre com machismo e heteronormatividade.

Mas primeiro eu quero explicar o conceito de heteronormatividade e depois falar um pouco do machismo. Um é consequência do outro e um está contido no outro. 

HETERONORMATIVIDADE 

Vários autores, estudiosos, teóricos e cientistas sociais tentaram teorizar e problematizar o conceito por trás da ideia de heteronormatividade. Muito se tem falado sobre ela e pouco se tem discutido (em âmbito mundial) sobre os seus efeitos nas vidas tanto de LGBTs quanto de heterossexuais. Em suma, a heteronormatividade pode ser definida como práticas e instituições que legitimam e privilegiam a heterossexualidade e relacionamentos heterossexuais como fundamentais e 'naturais' dentro da sociedade". 

Assim sendo, podemos estabelecer certos comportamentos de lésbicas como heteronormativos, ao passo que indicam uma certa preferência por papéis de gêneros bem exemplificados na relação através de uma divisão clara de comportamentos entre as duas companheiras. Exemplos claros seriam a lésbica masculinizada que se comporta como o gênero masculino na relação enquanto lê sua companheira como o gênero feminino. A lésbica masculina (conhecida como Butch, Caminhão, Bofinho), que prefere lésbicas femininas (conhecidas como Femme, Lady), porque esse tipo de relacionamento pode afirmar o papel de homem e mulher, mesmo que biologicamente falando, a relação seja entre duas mulheres. 

Aqui estamos falando do imagético. Falamos do que se lê e não do que se é. Pelo olhar atual de nossa sociedade, ao vermos uma lésbica masculina já tachamos em nossa mente que aquela mulher é a parte ativa na relação. E isso vai muito além do sexo: pode ser ativa por ser a que trabalha, a que toma a frente, a que decide tudo, que, em nossa mente, adota o papel do homem. Isso tudo se dá porque a definição que temos de masculino e feminino é pautada pela heteronormatividade. Em nossa mente, homem e mulher tem seus papéis bem definidos dentro da sociedade e suas instituições. Papéis esses que reforçam conceitos machistas de que mulheres e homens devem ter comportamentos diferentes e que para uns certos comportamentos são tolerados e para outros, outros tipos de comportamentos são censurados. 

MACHISMO

Machismo é um conceito que está dentro do conceito de heteronormatividade. baseia-se na supervalorização das características físicas e culturais associadas com o sexo masculino, em detrimento daquelas associadas ao sexo feminino, pela crença de que homens são superiores às mulheres. Só com essa definição fica claro que é um conceito que já está enraizado em nossa sociedade há muito tempo. Por isso fica tão difícil erradicá-lo, ou senão, amenizá-lo do nosso convívio. E não são somente homens que reproduzem discursos e comportamentos machistas. Mulheres tanto heterossexuais quanto as homossexuais reproduzem sim o machismo no dia a dia e isso é muito triste. Somente desmascarando, apontando, discutindo e problematizando, podemos tirar isso de nós. Assim teremos uma convivência mais harmoniosa com todos e poderemos respeitar mais a nós mesmas como mulheres. 

O machismo está presente sim nas relações lésbicas ao mesmo tempo em que está a heteronormatividade. O pensamento de que a figura feminina na relação deve se ater às tarefas domésticas e cuidar dos filhos é uma forma de reproduzir o machismo. Também o pensamento de que deve haver um "homem" na relação. A ideia de que uma das parceiras deve se comportar como a figura masculinizada que provê segurança, toma a frente, tem a iniciativa... São muitas maneiras e elas legitimam no casal o que a sociedade já vem querendo nos ensinar. De que as relações são saudáveis quando existe patriarcado, mesmo que esse patriarcado seja praticado por uma mulher reproduzindo e espelhando a masculinidade. 

CONCLUSÃO

Os papeis de feminino e masculino são construções binárias de uma sociedade há muito tempo heteronormativa que desde nosso nascimento dita nossos gostos, comportamentos, papéis na sociedade, tudo ligado ao órgão sexual com o qual nós nascemos. Mas saindo um pouco da caixinha, podemos repensar e desconstruir essa noção e concentrar nossos esforços e não estereotipar ninguém com base em um simples fato biológico, que não deve ser parâmetro para balizar o jeito que ninguém vai viver sua vida. Principalmente numa relação lésbica, onde a desconstrução deve sim ser uma constante. Lutar contra o machismo dentro da comunidade LGBT deve ser o ponto de partida, para depois lutarmos contra o machismo na sociedade como um todo. Somos nós as quem devemos parar de reproduzir conceitos machistas, mesmo que velados e pequenos. Assim, estaremos um passo mais perto de concretizar uma sociedade mais justa e igualitária para todos. 

sábado, 18 de fevereiro de 2017

Saber

Saber, não por vagas expressões de afeto
Não por tácitos olhares inquietos
Mas por toque e carícia
Por deleites e delícias
Que disparam meu coração
e bombeiam meu sangue em profusão

Saber, não por sabedoria humana
Bom senso da psicologia
Ou compatibilidade da astrologia
Mas por beijos molhados
Corpos suados
Que vivenciam a paixão
E fazem do vagabundo, rei, do príncipe, um pobretão

Saber, o que é mistério
Solucionar o desconhecido critério
Necessário para te conquistar
e te deixar aqui ao meu lado
mesmo que seja cedo ou errado
Mas sendo, já me satisfaz
E existindo a recíproca já me leva em paz

Crendices não fazem mais sentido
meus preconceitos foram atingidos
Desmoralizados pelo teu sorriso
Se vai durar eu não sei
Mas pensar em você me trouxe palavras
Necessárias para criar essas rimas
Agora essa é a minha sina
Esperar o teu sinal
Me confirmando se o sentimento é igual.